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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Bernardo Soares

LAGOA DA POSSE [a]

LAGOA DA POSSE

A posse é para meu pensar uma lagoa absurda — muito grande, muito escura, muito pouco profunda. Parece funda a água porque é falsa de suja.

A morte? Mas a morte está dentro da vida. Morro totalmente? Não sei da vida. Sobrevivo-me? Continuo a viver.

O sonho? Mas o sonho está dentro da vida. Vivemos o sonho? Vivemos. Sonhamo-lo apenas? Morremos. E a morte está dentro da vida.

Como a nossa sombra a vida persegue-me. E só não há sombra quando tudo é sombra. A vida só nos não persegue quando nos entregamos a ela.

O que há de mais doloroso no sonho é não existir. Realmente, não se pode sonhar.

O que é possuir? Nós não o sabemos. Como querer então poder possuir qualquer coisa. Direis que não sabemos o que é a vida, e vivemos... Mas nós vivemos realmente? Viver sem saber o que é a vida será viver?

s.d.

Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.II. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.

 - 464.
"Fase decadentista", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol I. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.