REGRESSO DOS DEUSES - Qual foi, porém, a razão por que esse acordar
REGRESSO DOS DEUSES
Qual foi, porém, a razão por que esse acordar do paganismo aconteceu em Portugal, e não alhures? Não é difícil de achar a explicação.
Nós vimos, quando estudámos o desenvolvimento do cristismo, que o grupo ibérico resultava grupo civilizacional especial em virtude do cruzamento, a ele peculiar, do tipo psíquico cristista e do tipo psíquico maometano.
Vimos que dado o carácter degenerescente do cristismo, a consolidação se deu quando, decaído o maometanismo na península, dele só ficou o mau, isto é, o fanatismo que promana de um sistema monoteísta, quando um elemento objectivista não ocorre em seu auxílio e disciplina. Ficou, portanto, a mentalidade peninsular representada por um cristismo violento, selvagem, no qual apenas no primeiro momento havia vestígios do cientismo árabe. Dado o primeiro passo para as descobertas, a fé mórbida dos nossos maiores cedo acabou com esses restos de objectivismo e de equilíbrio. Ficámos servos do mais retrógrado e do mais abjecto dos cristismos — um cristismo cujo elemento mais inferior (o monoteísmo judaico) havia recebido um impulso anormal em virtude da mistura com o monoteísmo maometano. Ter-nos-ia salvado o nosso paganismo de gentes do sul, se o vício não fora fundo demais para tal levante. Ficámos na decadência que esse estado moral representa, no eterno ponto morto do cristismo peninsular. Assim, por séculos fora, ficámos, espanhóis e portugueses, a abjecção viva da Europa, o mole refúgio da podridão cristista.
Os sucessivos sucessos revolucionários portugueses acabaram por destruir o catolicismo como fé real. Caímos a seguir, segundo a nossa herdada índole católica de escravos do estrangeiro, no mimetismo dos princípios revolucionários Mas o facto que permaneceu foi este: a destruição do catolicismo como fé real. Com isso ficou preparada a emergência do outro elemento da nossa psique, até aí latente: o elemento árabe.
Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1996.
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