INTERVALO [d]
INTERVALO
O homem que na avenida fugia das folhas e dos papéis que o vento arrastava atrás dele.
Na matemática [...] a do problema do momento, inquietantemente, subira ao problema metafisicamente considerado.
Descobrira que cada coisa era a origem de todo o movimento que fizera. O vento não arrasta a folha. Desperta nela a capacidade de se mexer. Mas nos ínfimos o impulso exterior é maior.
A folha, por exemplo só pode mexer-se ao sabor dos impulsos exteriores; mas isso não quer dizer que não se mexa de per si, que não tenha alma (para se mover!)
As coisas falam aos meus olhos apavorados.
O movimento é a vida, o sinal da vida.
Transmitir movimento é pois ou transmitir vida ou despertar vida. Vida não se pode transmitir. Só portanto despertar. Para a despertar é preciso que a haja onde a despertemos.
Uma pedra tem portanto vida, um grau ínfimo de vida talvez, mas sempre vida.
Vida é consciência.
Livro do Desassossego. Vol.I. Fernando Pessoa. (Organização e fixação de inéditos de Teresa Sobral Cunha.) Coimbra: Presença, 1990.
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