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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Raphael Baldaya

PRINCÍPIOS DE METAFÍSICA ESOTÉRICA

PRINCÍPIOS DE METAFÍSICA ESOTÉRICA

Recentemente tem tomado um grande relevo pelo mundo a propaganda da religião chamada Teosofia. Essa religião pretende ser a da Verdade; se não tivesse essa pretensão não seria uma religião. Pretende estar por detrás de todas as religiões. Pretende ser a depositária das antigas doutrinas ocultas; pretende representaruma comunicação para o exterior feita pelos chamados «Mestres».

Urge expor do modo mais claro e preciso qual é, segundo a ciência esotérica verdadeira, a constituição real do Universo. Não importa ao leitor como estas verdades se determinaram, de onde elas partem. A sua aceitação não é necessária para ninguém. Mas elas expõem-se, porque chegou a hora de se exporem, porque é preciso que elas sejam dadas ao mundo. O resto não tem importância.

Compêndio de Hiperciência.

Compêndio de Cosmologia oculta.

Este trabalho, de que fui encarregado, procuro fazê-lo o melhor que possa, sendo preciso, lúcido e esquemático, quanto possível, na minha exposição.

Uma última pergunta poderá ocorrer aos leitores: qual a razão porque este tratado sai primeiro em português do que em outra lingua qualquer, porque em uma das línguas, não talvez menos faladas, mas por certo menos lidas, do mundo? Porque isso tem de ser assim, dado o grande Destino oculto que Portugal tem de cumprir, continuando o que já cumpriu, aquele destino que o Senhor da Ciência segredou ao Infante D. Henrique em Sagres, para que ele o pusesse em prática.

Portugal é um Ente. Esse ente tem que cumprir um destino. Esse destino envolve que as verdades que este livro revela sejam dadas primeiro em português do que em outra língua qualquer.

Este sistema não será exposto como um sistema metafísico, que se prove; mas sim como um sistema religioso, dogmaticamente. Mas ele tal é, que, uma vez lido, a sua verdade será vista por aqueles que está destinado que a vejam.

Invocam os teosofistas a íntima continuidade da tradição hermética ou esotérica. Segundo Mrs. Besant (quote here the due part of the Ideals of Theosophy).

Infelizmente o estudo da literatura ligada à exposição, propositadamente confusa, das teorias que formavam a base metafísica das sociedades secretas como os Rosa-Cruz — infelizmente esse estudo revela princípios fundamentais que, qualquer que seja o seu sentido simbólico, se não casam de modo algum com as teorizações teosóficas.

Assim, se há coisa que resulta clara da confusa doutrina dos esotéricos europeus, é que o sexo feminino é, por várias razões de ordem simbólica, considerado por ele como inferior e quase mau. Escusamos de rebuscar muito na literatura hermética. (Q from Hargrave Jennings).

Como é que isto se concilia com a tese teosofista que o que há de principal é a Fraternidade humana, esta sem olhar a sexo, raça ou casta?

Além disso os herméticos europeus não se propunham trabalhar pela humanidade. Nada disso se conclui dos seus escritos, e estes, embora nos não revelem o seu sistema como conjunto, não deixam de, fragmento a fragmento, nos revelar de que elementos ele se compõe.

A teosofia, como é próprio e de esperar da nossa época, é apenas uma democratização do hermetismo. Se se quiser, é uma cristianização dele. Mais nada. Cristianização ou Democratização feita com a ideia de Fraternidade, por sinal a mais baixa das três que compõem a trindade francesa.

Os herméticos europeus constituíam sociedades secretas para fazer determinadas investigações científicas. Até que ponto essas investigações foram é hoje impossível, talvez, de determinar. Se essas investigações representam uma tradição remota, é possível julgá-lo. Para que o faziam é simples.

As castas sacerdotais e outras perderiam certo poder sobre o povo se divulgassem certos princípios científicos, os quais, aliás, permitiam, na baixa dos sentimentos religiosos, o recurso a fraudes religiosas, por meio de aplicações científicas não muito diversas dos hodiernos processos de alta prestidigitação, de prestidigitação científica.

O vagar que as classes superiores tinham nos tempos da escravatura torna possível uma extensa investigação científica.

Suponha-se que um padre egípcio descobria a lei da propagação do som, pelo que respeita às câmaras sonantes. A utilização religiosa, fraudulenta (ainda que, talvez, sem má intenção) desse princípio inibiria totalmente que pensasse em divulgá-lo.

s.d.

Fernando Pessoa et le Drame Symboliste: Héritage et création. Maria Teresa Rita Lopes. Paris: F. C. Gulbenkian, 1977.

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