Cansamo-nos de tudo, excepto de compreender.
Cansamo-nos de tudo, excepto de compreender.
O sentido da frase é por vezes difícil de atingir.
Cansamo-nos de pensar para chegar a uma conclusão, porque quanto mais se pensa, mais se analise, mais se distingue, menos se chega a uma conclusão.
Caímos então naquele estado de inércia em que o mais que queremos é compreender bem o que é exposto — uma atitude estética, pois que queremos compreender sem nos interessar, sem que nos importe que o compreendido seja ou não verdadeiro, sem que vejamos mais no que compreendemos senão a forma exacta como foi exposto, a posição de beleza racional que tem para nós.
Cansamo-nos de pensar, de ter opiniões nossas, de querer pensar para agir. Não nos cansamos, porém, de ter, ainda que transitoriamente, as opiniões alheias, para o único fim de sentir o seu influxo e não seguir o seu impulso.
Livro do Desassossego. Vol.I. Fernando Pessoa. (Organização e fixação de inéditos de Teresa Sobral Cunha.) Coimbra: Presença, 1990.
- 214.