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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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António Mora

Uma coisa queremos

Uma coisa queremos

Outra coisa fazemos.

Quem quer somos nós sós

Quem faz não somos nós.

Quem somos tem o intuito

Quem não somos o fruto

Alheio à intenção.

Todos não são quem são.

Uma coisa é a verdade,

Outra a realidade.

O que existe não tem

Que ver com haver alguém.

Alheio a nós o mundo,

Num sentido profundo,

Por leis e reis se guia

Em que a nossa energia,

O nosso sentimento,

O nosso pensamento

São elementos falsos...

Assim, a pedra incerta

Que a criança irrequieta

Atira ao vácuo do ar

Vai às vezes parar

Onde magoa ou fere

Não o que a criança quer

Mas o que o Fado quis

Por isso a pedra infeliz

O Destino atirou,

Nunca quem a lançou.

Outros somos. Morremos

A vida que vivemos.

Quem é nós não é nada.

Passa quem és na estrada

Da nossa consciência.

Para isto não há ciência.

10-10-1919

Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990.

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