Depende do governo e de nós o haver ou não haver uma reacção monárquica.
Iconoclasta
ou Considerações pós-revolucionárias
Depende do governo e de nós o haver ou não haver uma reacção monárquica. Só há reacção e verdadeiro antiliberalismo onde o liberalismo não compreende a sua missão — onde os "liberais" usam métodos reaccionários e opressivos como esperar que os de tendências reaccionárias os não usem? Primeiro porque esse emprego de tais métodos pelos liberais implica a presença de elementos reaccionários no psiquismo nacional; 2º porque esses métodos andam sempre unidos a uma certa incapacidade administrativa, que dá aos inimigos do "liberalismo" vigente os argumentos e (...); 3º porque naturalmente é contra esses conservadores que os métodos antiliberais se [...] praticam e a repressão é suicida em qualquer caso político.
É fácil matar de todo o que muito de conservantismo que ainda amplamente existe na sociedade portuguesa: é dar liberdade, e mais liberdade, e mais liberdade ainda, defender a república pela liberdade e não pela coacção.
Ora nós não vamos jurar que o espírito do governo provisório seja inteiramente esse. De alguns dos membros dele temos por certo que não é.
Ponham os olhos na República Francesa: vejam o desastre que aquilo é e tem sido; a França — um dos países mais alegremente infelizes do mundo — tem vivido, malgré os seus sistemas políticos, com uma monarquia péssima e depois com uma república apenas melhor por não ter espírito monárquico (?) mas ainda assim pavorosamente má.
Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979.
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