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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Álvaro de Campos

PARAGEM. ZONA

PARAGEM. ZONA

Tragam-me esquecimento em travessas!

Quero comer o abandono da vida!

Quero perder o hábito de gritar para dentro.

Arre, já basta! Não sei o quê. mas já basta...

Então viver amanhã, hein?... E o que se faz de hoje?

Viver amanhã por ter adiado hoje?

Comprei por acaso um bilhete para esse espectáculo?

Que gargalhadas daria quem pudesse rir!

E agora aparece o eléctrico — o de que eu estou à espera —

Antes fosse outro... Ter de subir já!

Ninguém me obriga, mas deixai-o passar, porquê?

Só deixando passar todos, e a mim mesmo, e à vida...

Que náusea no estômago real que é a alma consciente!

Que sono bom o ser outra pessoa qualquer...

Já compreendo porque é que as crianças querem ser guarda-freios...

Não, não compreendo nada...

Tarde de azul e ouro, alegria das gentes, olhos claros da vida...

28-5-1930

Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.

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