Álvaro de Campos
Os galos cantam e estou bebedíssimo.
Os galos cantam e estou bebedíssimo.
Não fiz nada da vida senão tê-la.
Mal amei, bebi bem, sonhei muitíssimo.
Minha intenção não foi a minha estrela.
Os galos cantam e eu cada vez mais
Absorto no disperso que o álcool dá.
Curara-me talvez a vida, ou sais,
Ou poder crer, ou desejar o que há.
Cantam tantos tão galos que me irrita
Que a noite que ainda dura possa ser.
Mas virá o dia, e, ao fim da parte escrita,
A morte marra e eu deixo-me colher.
4-10-1931
Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.
- 240.Fernando Pessoa?