Não a ti, mas aos teus, odeio, Cristo.
Não a ti, mas aos teus, odeio, Cristo.
Tu não és mais que um deus a mais no eterno
Pantéon que preside
À nossa vida incerta.
Nem maior nem menor que os novos deuses,
Tua sombria forma dolorida
Trouxe algo que faltava
Ao número dos divos.
Por isso reina a par de outros no Olimpo,
Ou pela triste terra se quiseres
Vai enxugar o pranto
Dos humanos que sofrem.
Não venham, porém, estultos teus cultores
Em teu nome vedar o eterno culto
Das presenças maiores
E parceiras da tua.
A esses, sim, do âmago eu odeio
Do crente peito, e a esses eu não sigo,
Supersticiosos leigos
Na ciência dos deuses.
Ah, aumentai, não combatendo nunca.
Enriquecei o Olimpo, aos deuses dando
Cada vez maior força
Plo número maior.
Basta os males que o Fado as Parcas fez
Por seu intuito natural fazerem.
Nós homens nos façamos
Unidos pelos deuses.
Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994.
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