Ricardo Reis
- Diana através dos ramos
- Aqui, sem outro Apolo do que Apolo,
- Em Ceres anoitece.
- Não a ti, mas aos teus, odeio, Cristo.
- Sofro, Lídia, do medo do destino. [1]
- Sofro, Lídia, do medo do destino. [2]
- Sê dono de ti
- Não sem lei, mas segundo leis diversas
- Breve o dia, breve o ano, breve tudo.
- Domina ou cala. Não te percas, dando
- Tudo, desde ermos astros afastados
- Ninguém, na vasta selva virgem
- Se a cada coisa que há um deus compete,
- Querido Mestre:
- Quanto faças, supremamente faze.
- Rasteja mole pelos campos ermos
- Azuis os montes que estão longe param.
- Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros
- Severo narro. Quanto sinto, penso.
- Tudo que cessa é morte, e a morte é nossa
- A cada qual, como a estatura, é dada
- Nem da erva humilde se o Destino esquece.
- Quem diz ao dia, dura! e à treva, acaba!
- No magno dia até os sons são claros.
- Negue-me tudo a sorte, menos vê-la,
- Quero dos deuses só que me não lembrem.
- Se recordo quem fui, outrem me vejo,
- Aos deuses peço só que me concedam
- Quando, Lídia, vier o nosso Outono
- Cada um cumpre o destino que lhe cumpre.
- Ténue, como se de Éolo a esquecessem,
- Meu gesto que destrói
- No breve número de doze meses
- Sob a leve tutela
- Não sei de quem recordo meu passado
- Cuidas tu, louco Flaco, que apertando [1]
- Não consentem os deuses mais que a vida. [2]
- O mar jaz. Gemem em segredo os ventos [2]
- Não pra mim mas pra ti teço as grinaldas
- XV - Este, seu escasso campo ora lavrando, [1]
- V - Como se cada beijo
- XVI - Tuas, não minhas, teço estas grinaldas,
- XIII - Olho os campos, Neera, [1]
- Severo narro. Quanto sinto, penso.
- No ciclo eterno das mudáveis coisas
- Sereno aguarda o fim que pouco tarda.
- Já sobre a fronte vã se me acinzenta
- Ninguém a outro ama, senão que ama
- Não só vinho, mas nele o olvido, deito
- Quem na infância leu Horácio no original,
- Vive sem horas. Quanto mede pesa,
- Quanta tristeza e amargura afoga
- Fui forte, venci as misérias da alma com a alma toda.
- Para ser grande, sê inteiro: nada
- Frutos, dão-os as árvores que vivem,
- A ciência é a única força intelectual moderna…
- Quero ignorado, e calmo
- Gozo sonhado é gozo, ainda que em sonho.
- Entre os homens cultos, a ciência substituirá a religião.
- Cada dia sem gozo não foi teu
- Pois que nada que dure, ou que, durando,
- Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge.
- Aqui, neste misérrimo desterro
- Felizes, cujos corpos sob as árvores
- Segue o teu destino,
- Feliz aquele a quem a vida grata
- Não a ti, Cristo, odeio ou te não quero.
- Não a ti, Cristo, odeio ou menosprezo
- Uma após uma as ondas apressadas
- I - Seguro assento na coluna firme [1]
- Não quero as oferendas
- Vossa formosa juventude leda,
- Não canto a noite porque no meu canto
- Nestes poemas aparentemente tão símplices, o crítico, se se dispõe...
- É notável que toda a obra de fôlego, pela qual um indivíduo se institui...
- Por certo que a obra tem defeitos, e defeitos que, sendo para mim bem patentes,
- Não ignoro que esses dois poemas são duas pérolas da poesia amorosa...
- Tão pouco se assemelha ao politeísmo da Índia,
- Não tenhas nada nas mãos
- Sábio é o que se contenta com o espectáculo do mundo,
- O andaime - Este título, embora da autoria de Caeiro,
- II - As rosas amo dos jardins de Adónis
- A religião é uma metafísica recreativa.
- Tão profundo é o seu pressentimento da alma pagã, que os seus poemas,
- XX - Cuidas, ínvio, que cumpres, apertando
- IV - Não consentem os deuses mais que a vida.
- Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.
- Da nossa semelhança com os deuses
- Só esta liberdade nos concedem
- Aqui, Neera, longe
- Da lâmpada nocturna
- Um conceito moderno do paganismo tende, por força, a concebê-lo...
- Ricardo Reis: O REGRESSO DOS DEUSES
- Se já não torna a eterna primavera
- Sem clepsidra ou relógio o tempo escorre
- Sob estas árvores ou aquelas árvores
- Quando Neptuno houver alongado
- Me concedam os deuses lá do alto
- Antes de ti era a Mãe Terra escrava
- Jovem morreste, porque regressaste,
- Quero, da vida, só não conhecê-la.
- Nada me dizem vossos deuses mortos
- Se em verdade não sabes (nem sustentas
- Chamaram-o os Deuses, ainda tão novo, à região inferior onde a mágoa não chega...
- Por detrás de todas as variações permanece,
- Os conceitos modernos do paganismo têm de comum,
- Eu não vou, evidentemente, fazer nas escassas páginas
- A diferença substancial entre o paganismo...
- Nada fica de nada. Nada somos. [1]
- OS DEUSES: DEFESA DELES
- Nada fica de nada. Nada somos. [2]
- Que mais que um ludo ou jogo é a extensa vida,
- Grinalda ou coroa
- Amo o que vejo porque deixarei
- Vivem em nós inúmeros;
- Cada momento que a um prazer não voto
- Cada um é um mundo; e como em cada fonte
- Cantos, risos e flores alumiem
- Como este infante que alourado dorme
- Sempre me teve o breve tempo febril
- Ser feliz é um jugo, o ser grande
- Vem Orfeu, uma sombra
- Com que vida encherei os poucos breves
- Não torna ao ramo a folha que o deixou,
- Nem vã esperança vem, não anos vão,
- O relógio de sol partido marca
- Enquanto eu vir o sol luzir nas folhas
- Quantos gozam o gozo de gozar
- Floresce em ti, ó magna terra, em cores
- Toda a visão da crença se acompanha,
- Pese a sentença igual da ignota morte
- Vou dormir, dormir, dormir,
- Pensa quantos, no ardor da jovem ida,
- Àquele que, constante, nada espera
- Amanhã estas letras em que te amo
- Enquanto ao longe os bardos perturbarem
- Fazer parar o giro sobre si
- Manhã que raias sem olhar a mim,
- Flores que colho, ou deixo,
- Cedo demais vem sempre, Cloé, o inverno.
- Maior é quem a passo e passo avança
- No momento em que vamos pelos prados
- Não batas palmas diante da beleza.
- Os deuses são felizes.
- Cumpre a lei, seja vil ou vil tu sejas.
- Não morreram, Neera, os velhos deuses.
- A mão invisível do vento roça por cima das ervas. [ À la manière de A. Caeiro ]
- Para os deuses as coisas são mais coisas.
- Um verso repete
- Tornar-te-ás só quem tu sempre foste.
- Em vão procuro o bem que me negaram.
- Não quero a fama, que comigo a têm
- Coroai-me de rosas! [3]
- Breve o inverno virá com sua branca
- Cuidas tu, louro Flacco, que cansando [2]
- Neera, passeemos juntos
- Não como ante donzela ou mulher viva
- O ritmo antigo que há nos pés descalços
- Não porque os deuses findaram, alva Lídia, choro…
- Passando a vida em ver passar a de outros,
- Neste dia em que os campos são de Apolo
- Olho os campos, Neera [4]
- O que sentimos, não o que é sentido,
- Quer pouco: terás tudo.
- Não só quem nos odeia ou nos inveja
- Não quero, Cloé, teu amor, que oprime
- Olho os campos, Neera, [2]
- Não sei se é amor que tens, ou amor que finges,
- Olho os campos, Neera, [3]
- Nunca a alheia vontade, inda que grata,
- No mundo, só comigo, me deixaram
- Os deuses e os Messias que são deuses
- Do que quero renego, se o querê-lo
- Sim, sei bem
- Solene passa sobre a fértil terra
- Deverá a ciência deixar livre um campo inferior às religiões…
- Atrás não torna, nem, como Orfeu, volve
- Maurras e os seus são os românticos da Disciplina.
- A nada imploram tuas mãos já coisas,
- Dir-me-ão que a poesia nada tem com os fenómenos puramente intelectuais.
- Aqui, dizeis, na cova a que me abeiro,
- A moderna literatura é uma literatura de masturbadores.
- Uns, com os olhos postos no passado,
- Lenta, descansa a onda que a maré deixa.
- PREFÁCIO às «Odes»
- Súbdito inútil de astros dominantes,
- O sono é bom pois despertamos dele
- O IDEAL PAGÃO
- Aguardo, equânime, o que não conheço —
- O rastro breve que das ervas moles
- VII - Ponho na altiva mente o fixo esforço
- Pesa o decreto atroz do fim certeiro.
- XI - Temo, Lídia, o destino. Nada é certo.
- Nos altos ramos de árvores frondosas
- XVII - Não queiras, Lídia, edificar no espaço [1]
- Inglória é a vida, e inglório o conhecê-la.
- XVIII - Saudoso já deste Verão que vejo.
- Deixemos, Lídia, a ciência que não põe
- É tão suave a fuga deste dia,
- Para os deuses as coisas são mais coisas.
- Não quero recordar nem conhecer-me.
- A abelha que, voando, freme sobre
- Dia após dia a mesma vida é a mesma.
- Flores que colho, ou deixo,
- XII - A flor que és, não a que dás, eu quero.
- X - Melhor destino que o de conhecer-se
- XIV - De novo traz as aparentes novas
- VIII - Quão breve tempo é a mais longa vida
- Tão cedo passa tudo quanto passa!
- XIX - Prazer, mas devagar,
- Prefácio de Ricardo Reis ao seu livro ODES:
- Deve haver, no mais pequeno poema de um poeta, qualquer coisa...
- Os parentes de Alberto Caeiro, a quem ele deixou entregue ...
- II - Digo de Alberto Caeiro que ele é o maior poeta moderno,
- Um poema é a projecção de uma ideia em palavras através da emoção.
- III - Em que é que este homem pode ser aquilo que eu disse...
- VI - O ritmo antigo que há em pés descalços, [1]
- Ao homem extraordinário, cujos poemas, não só inéditos,
- Vós que, crentes em Cristos e Marias
- O desprezo de Campos pela exactidão de frases,
- O nosso único esforço deve ser para que a nossa nação seja o mais culta,
- III - O mar jaz; gemem em segredo os ventos [1]
- A arte consiste na organização ideal da matéria.
- Antes de nós nos mesmos arvoredos
- … a própria sensualidade com sua animalidade directa…
- Acima da verdade estão os deuses.
- A música é apenas a forma subtilizada das artes de comunicação social.
- Anjos ou deuses, sempre nós tivemos
- Quando há alguma coisa de belo a dizer em vida, esculpe-se;
- Tirem-me os deuses
- A arte existe, não, como Campos quer, para substituir a vida, senão para a completar.
- Bocas roxas de vinho
- Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia
- Prefiro rosas, meu amor, à pátria,
- Todos os movimentos que, adentro da nossa civilização,
- Por isso, quando me declaro pagão, e amo a obra de Caeiro,
- O homem extraordinário, cujos poemas, não só inéditos,
- Alberto Caeiro da Silva nasceu em Lisboa...
- Quando pela primeira vez, estando então em Portugal,
- Alberto Caeiro é, cremos, o maior poeta do século vinte,
- Morto o autor destes poemas, e deixados eles ao abandono,
- Das tentativas de paganismo, que o século passado produziu, não há uma...
- Mestre, são plácidas
- Os deuses desterrados, [1]
- IX - Coroai-me de rosas, [1]
- O deus Pã não morreu,
- De Apolo o carro rodou pra fora
- Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
- Ao longe os montes têm neve ao sol,
- Só o ter flores pela vista fora
- A palidez do dia é levemente dourada.
- Seguro assento na coluna firme [ 2]
- Seguro assento na coluna firme [ 3]
- A flor que és, não a que dás, eu quero. [2]
- Não queiras, Lídia, edificar no espaço [2]
- Este, seu escasso campo ora lavrando, [2]
- Não tenhas nada nas mãos [2]
- Quero, Neera, que os teus lábios laves
- Os deuses desterrados [2]
- Coroai-me de rosas. [2]
- Na prosa o ritmo existe; na poesia o ritmo é.
- Prefácio de Ricardo Reis: [a]
- Prefácio de Ricardo Reis: [b]
- São de três espécies os erros vulgarmente cometidos...
- Sabeis porém, Mestre, que com certos abusos vossos de expressão...
- Doce é o fruto à vista, e à boca amaro,
- Eu nunca fui dos que a um sexo o outro
- Há uma cor que me persegue e que eu odeio,
- Uma cor me persegue na lembrança,
- Ininterrupto e unido guia o teu curso
- Não mais pensada que a dos mudos brutos
- No grande espaço de não haver nada
- Outros com liras ou com harpas narram,
- Quatro vezes mudou a estação falsa
- Se hás-de ser o que choras
- Dois é o prazer: gozar e o gozá-lo.
- Concentra-te, e serás sereno e forte;
- O anel dado ao mendigo é injúria, e a sorte
- Tarda o verão. No campo tributário
- Sê lanterna, sê luz com vidro em torno,
- Quem fui é externo a mim. Se lembro, vejo;
- Débil no vício, débil na virtude
- Quem és, não o serás, que o tempo e a sorte
- Flores amo, não busco. Se aparecem
- Para quê complicar inutilmente,
- Qual, Pirro, aquilo gosta que o amarga,
- Quis que comigo vísseis
- Sob o jugo essencial e (...)
- Crer é errar. Não crer de nada serve.
- Nem relógio parado, nem a falta
- Pequeno é o espaço que de nós separa
- A vida é triste. O céu é sempre o mesmo. A hora
- Quero versos que sejam como jóias
- E quanto sei do Universo é que ele
- Pequena vida consciente, sempre
- Nem destino sem esperança
- Pequena vida consciente
- Nós ao igual destino
- De uma só vez recolhe
- Folha após folha vemos caem
- Quer com amor, que sem amor, senesces
- A folha insciente, antes que a própria morra
- Não inquiro do anónimo futuro
- Hora a hora não dura a face antiga
- Não torna atrás a negregada prole
- Deixa passar o vento
- Pobres de nós que perdemos quanto
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