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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Álvaro de Campos

Eu cantarei,

                I

Eu cantarei,

Quando a manhã abrir as portas do meu esforço,

Eu cantarei,

Quando o alto-dia me fizer fechar os olhos,

Eu cantarei,

Quando o crepúsculo limar as arestas,

Eu cantarei,

Quando a noite entrar como a Imperatriz vencida

Eu cantarei a Tua Glória e o meu desígnio.

Eu cantarei

E nas estradas ladeadas por abetos,

Nas áleas dos jardins emaranhados,

Nas esquinas das ruas, nos pátios

Das casas-de-guarda,

A Tua Vitória entrará como um som de clarim

E o meu Desígnio espera-la-á sem segundo pensamento.

                II

Perto da minha porta

Onde brincam as crianças dos outros,

Rompe um canto infantil, disciplinado e cómodo,

E eu sou a quinta criança ali, se houver só quatro,

E ninguém me abandonar embora eu não esteja lá

Canto também, dormindo transparente e calado.

s.d.

Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.

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