Sendo esta revista dada como «de cultura cosmopolita»
Sendo esta revista dada como «de cultura cosmopolita» e, ao mesmo tempo, apresentada e dirigida por quem, do pouco que tem publicado, tem o nome ligado a uma teoria que, se alguma coisa parece e é, é nacionalista, carece o facto de explicação e elucidação.
Essa elucidação é fácil e simples.
Consigne-se desde já e d'antemão a adesão completa e a manutenção integral que o autor d'este prefácio dá às suas teorias expostas n'A AGUIA. Continua ele a sustentar que o período de máxima vitalidade nacional é aquele em que uma nação mais se entrega a si própria e à sua alma. Nacionalismo fundamental, portanto.
Mas há três géneros de nacionalismo.
O que pois convém precisar, e naqueles artigos se não precisou, é qual d'esses três nacionalismos é que é o superior, aquele que distingue esses períodos culminantes da vida das nacionalidades.
Dos três nacionalismos, o primeiro e o inferior é aquele que se prende às tradições nacionais e é incapaz de se adaptar às condições civilizacionais gerais. É, na literatura, o nacionalismo de Bocage e dos arcades em geral, até Castilho. Caracteriza-o nas suas relações com a civ[ilização] geral o estar sempre em atraso e preso a tradições.
O segundo nacionalismo é aquele que se prende, não às tradições, mas à alma directa da nação, aprofundando-a mais ou menos. É o de um Bernardim Ribeiro, no seu grau inferior, e de um Teixeira de Pascoais no seu alto grau.
O terceiro nacionalismo é o que n'um nacionalismo real integra todos os elementos cosmopolitas. É, no seu grau inferior, o de Camões; no seu alto grau ainda o não tivemos entre nós, mas há-o em Shakespeare, em Goethe, em (...) — em todos os representantes supremos das culminâncias literárias das nações que aí chegaram.
Cada um d'estes nacionalismos tem 3 graus — segundo (...)
Nacionalismo tradicionalista — eis o inferior.
Nacionalismo integral — eis o médio.
Nacionalismo cosmopolita — eis o supremo.
Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.
- 179.