[Carta a Ophélia Queiroz - 15 Out. 1920]
Bebezinho:
Tens mais que milhares — tens milhões — de razões para estares zangada, irritada, ofendida comigo. Mas a culpa mal tem sido minha; tem sido daquele Destino que acaba de me condenar o cérebro, não direi definitivamente, mas, pelo menos, a um estado que exige um tratamento cuidado, como não sei se poderei ter.
Tenciono (sem aplicar agora o célebre decreto de 11 de Maio) ir para uma casa de saúde para o mês que vem, para ver se encontro ali um certo tratamento que me permita resistir à onda negra que me está caindo sobre o espírito. Não sei o resultado do tratamento — isto é, não antevejo bem qual possa ser.
Nunca esperes por mim; se te aparecer será de manhã, quando vais para o escritório, no Poço Novo.
Não te preocupes.
Afinal o que foi? Trocaram-me pelo Álvaro de Campos!
Sempre muito teu
Fernando
15/10/1920
Cartas de Amor. Fernando Pessoa. (Organização, posfácio e notas de David Mourão Ferreira. Preâmbulo e estabelecimento do texto de Maria da Graça Queiroz.) Lisboa: Ática, 1978 (3ª ed. 1994).
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