Em todos os tempos, quaisquer que fossem as religiões...
Em todos os tempos, quaisquer que fossem as religiões que dominassem, os homens sentiram, clara ou obscuramente, a força do Destino . Os pagãos, que tinham um panteão de deuses aparentemente escravos apenas dos seus caprichos, punham, contudo, acima desses deuses todos, a concepção do DESTINO, a que eles eram também obrigados a obedecer. Os cristãos representavam essa força que sentiam como sendo a Vontade de Deus, mas o facto é que todos percebiam como, acima da sua vontade livre ou presa, pairava uma força superior, que lhes talhava as vidas fora dos seus desejos, e, muitas vezes contra eles. Enquanto se tratava de circunstâncias do espírito, de acções humanas, era possível atribuir tudo ao livre‑arbítrio do homem. Mas, quando se reparava na quantidade de coisas da vida que acontecem do exterior, na quantidade de coisas, que, são puramente «acidentais», são, contudo, tantas vezes de uma importância máxima, capital, na vida — verificava‑se que outra coisa havia de se admitir para além da vontade humana. Aqui via‑se uma vida que parecia destinada a grandes obras cortada cerce por um desastre, por um naufrágio, por uma doença. (...)
Textos Filosóficos . Vol. I. Fernando Pessoa. (Estabelecidos e prefaciados por António de Pina Coelho.) Lisboa: Ática, 1968 (imp. 1993).
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