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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

1. Chama-se ciência ao modo de actividade (intelectual) humana…

1. Chama-se ciência ao modo de actividade (intelectual) humana que investiga as leis — isto é, as relações constantes — das coisas. Não há ciência senão das relações entre as coisas; porque de uma coisa isolada não pode haver ciência, nada se concluindo da existência de uma coisa isolada senão o mero facto de que essa coisa existe. Mesmo a investigação da natureza de uma coisa qualquer não é senão a investigação d'aquilo em que essa coisa difere de, ou se parece com, outras coisas.

2. As relações entre as coisas são de três ordens conforme resultem da mera comparação das coisas umas às outras, das influências de umas sobre outras, ou da origem de uma com respeito às outras (...)

A matemática é a ciência que trata das dimensões das coisas, (consideradas simplesmente como coisas) (...)

A álgebra trata das dimensões das coisas consideradas abstractamente como dimensões.

A aritmética trata das dimensões das coisas consideradas com referência a uma determinada coisa — chamada unidade, nos termos — isto é, com respeito à dimensão — da qual — todas as outras coisas são expressas.

A geometria (é aquela parte da mat[emática] que) trata das dimensões das coisas consideradas como existindo no espaço.

Tudo quanto existe no espaço tem um volume, isto é, um modo de ser pelo qual é acessível à vista, ou que pode ser considerado como sendo acessível à vista. — Assim uma imaginável estrela qualquer que possa estar tão longe que nenhum telescópio nosso a torne visível, ou uma imaginável parcela mínima de matéria, tão pequena que nenhum microscópio nosso no-lo traga aos olhos, são ainda assim tidas por visíveis — uma se estivesse mais perto ou tivéssemos telescópios mais fortes, outra se tivéssemos microscópios mais aperfeiçoados.

Nota.

É preciso não confundir volume com massa.

O movimento (base da realidade concreta) não é visível; o que é visível é o que se move; o movimento não ocupa espaço (cf. arg[umen]to de Zenão; confusão do movimento com a massa que se move), as coisas que se movem é que o ocupam.

A realidade das coisas consideradas estaticamente (sem referência a dinamicamente) é apenas uma realidade abstracta.

Ax[iom]a do movimento toma em conta a massa (há aqui um pulo da geometria para a mecânica, porque nada geométrico habilita a compreender a massa) (não é a massa o essencial: é o movimento; a massa é ela própria (certo ?) um resultado de um movimento) (Por isso a mecânica é a primeira ciência concreta).

(Por isso a mat[emáti]ca não tem valor prático senão aplicada, isto é, aplicada a outras ciências que, elas, estão em relação e são directamente aplicadas à realidade)

— O que é que distingue o cubo-realidade do cubo-abstracção? — lº a imperfeição; 2º a massa; (...)

s.d.

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

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