Fernando Pessoa
Já me não pesa tanto o vir da morte.
Já me não pesa tanto o vir da morte.
Sei já que é nada, que é ficção e sonho,
E que, na roda universal da Sorte,
Não sou aquilo que me aqui suponho.
Sei que há mais mundos que este pouco mundo
Onde parece a nós haver morrer —
Dura terra e fragosa, que há no fundo
Do oceano imenso de viver.
Sei que a morte, que é tudo, não é nada,
E que, de morte em morte, a alma que há
Não cai num poço: vai por uma estrada.
Em Sua hora e a nossa, Deus dirá.
6-7-1934
Novas Poesias Inéditas. Fernando Pessoa. (Direcção, recolha e notas de Maria do Rosário Marques Sabino e Adelaide Maria Monteiro Sereno.) Lisboa: Ática, 1973 (4ª ed. 1993).
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