[5] A demonstração de que o soldado é um histero-epiléptico…
A demonstração de que o soldado é um histero-epiléptico ocasional: (1) O homem é um animal histérico, mas pouco histérico na normalidade. (2) Como histérico é sugestionável, mas, para dar consequências graves, a sugestão precisa ser fortíssima. (3) Na guerra a sugestão é fortíssima porque é colectiva e intensa. (4) A natureza da sugestão guerreira é de ser (a) violenta, (b) contrária à moral vulgar, (c) obnubiladora das inibições normais. A sugestão é portanto epileptóide.
Se, pois, o soldado, assassino ocasional, é um histérico-epiléptico ocasional, deduz-se que o assassino-nato é um histero-epiléptico-nato, e que a histero-epilepsia é um fenómeno mental que define a tendência para matar. Para matar há que haver (a) a histero-epilepsia, (b) uma sugestão externa bastante forte para a tornar activa pelo assassínio. (O caso do criminoso passional é intermédio entre o do soldado e o do criminoso-nato.) (Só não pode matar o homem que é incapaz de matar uma galinha — o que tem horror ao derramamento de sangue, ao rasgamento da carne, como o budista, e uma ou outra alma humana nas suas emoções.)
Ficção e Teatro. Fernando Pessoa. (Introdução, organização e notas de António Quadros.) Mem Martins: Europa-América, 1986
- 140.«O Caso Vargas». 1ª publ. in A Novela Policial-Dedutiva em Fernando Pessoa . Fernando Luso Soares. Lisboa: Diabril, 1976