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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

1. Manutenção da forma republicana de governo:

1. Manutenção da forma republicana de governo:

No interesse do próprio princípio monárquico, isto é, da sua perfeita aplicação, não deve ser por enquanto implantada a monarquia. O país não está ainda preparado para a monarquia, porque a Monarquia a implantar, devendo ser uma modernização do antigo regime português, é a tal ponto diferente de tudo quanto a mentalidade média, educada nas ideias liberais e democráticas, tem estado habituada a pensar, que a instituição de um sistema desses — supondo mesmo que ele já existisse composto e estudado — provocaria um sentimento de estranheza, breve dando em resultado a revolta, pelo aproveitamento dessa estranheza pelas forças liberais, apoiadas no estrangeiro moralmente, e, aproveitando-se dos erros, poucos ou muitos, que fatalmente os contra-revolucionários, uma vez no poder, haveriam de praticar.

Depois a implantação da monarquia, quer fosse a monarquia constitucional, tão má quase como a república, quer a outra monarquia, dava como resultado imediato o reaparecimento na cena política das velhas clientelas corruptas e gastas, a cuja acção dissolvente a própria queda da monarquia se deve.

Finalmente, para um regime novo, são precisos homens novos. Para a Monarquia Nova, começa por faltar o Rei; faltam os governantes, porque as clientelas antigas assaltariam de novo o poder, corruptas como sempre e mais ainda pelo seu exílio do poder; e faltam finalmente os próprios governados (como acima já se explicou).

Dá-se também o caso de a implantação da monarquia, qualquer que fosse, servir de estímulo ao revolucionarismo republicano, e manter portanto sempre aceso o foco de desordem. É preciso ver também que a implantação da monarquia não representaria um acto evolutivo, mas um acto revolucionário, pois quebrava a continuidade social.

2. O que é preciso, pois, é estabelecer uma fórmula de transição que sirva de declive natural para a monarquia futura, mas esteja em certa continuidade com o regime actual. Essa fórmula de transição, já tentada instintivamente por Sidónio Pais, e a república presidencialista, que, por ser república, não perde continuidade com o actual regime, e por restabelecer o poder pessoal começa já a introduzir um dos princípios fundamentais do regime futuro e da tradição portuguesa. A tradição não se reata: reconstrói-se.

s.d.

Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979.

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