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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Álvaro de Campos

Encostei-me para trás na cadeira de convés e fechei os olhos,

Encostei-me para trás na cadeira de convés e fechei os olhos,

E o meu destino apareceu-me na alma como um precipício.

A minha vida passada misturou-se-me com a futura,

E houve no meio um ruído do salão de fumo,

Onde, aos meus ouvidos, acabara a partida de xadrez.

Ah, balouçado

Na sensação das ondas,

Ah, embalado

Na ideia tão confortável de hoje ainda não ser amanhã,

De pelo menos neste momento não ter responsabilidades nenhumas,

De não ter personalidade propriamente, mas sentir-me ali,

Em cima da cadeira como um livro que a sueca ali deixasse.

Ah, afundado

Num torpor da imaginação, sem dúvida um pouco sono,

Irrequieto tão sossegadamente,

Tão análogo de repente à criança que fui outrora

Quando brincava na quinta e não sabia álgebra,

Nem as outras álgebras com x e y’s de sentimento.

Ah, todo eu anseio

Por esse momento sem importância nenhuma

Na minha vida,

Ah, todo eu anseio por esse momento, como por outros análogos

Aqueles momentos em que não tive importância nenhuma,

Aqueles em que compreendi todo o vácuo da existência sem inteligência para o compreender

E havia luar e mar e a solidão, ó Álvaro.

s.d.

Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993).

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