[Cartas a João Gaspar Simões - 16 Out. 1930]
Meu querido Camarada:
Já que tenho mantido tão brilhantemente a minha tradição de demorar tudo, quero também manter a tradição derivada de lhe pedir desculpa de o fazer.
Mando-lhe uma composição minha – aliás feita ontem – para a Presença ; mas realmente não sei se ainda
chegará a tempo.
Chamo a sua atenção para um pormenor que é preciso vigiar nas provas – o qual pormenor é dois pormenores. Trata-se de não esquecer as aspas que marcam o poema como «dramático», isto é, falado por terceira pessoa, e de verificar que, como essa pessoa é mulher (e, digamos, bruxa), os adjectivos não saiam no masculino onde a pessoa falante se refere a si mesma.
Uma advertência: este poema é uma interpretação dramática da «magia de transgressão». Se, por alguma circunstância, achar melhor não o publicar, não hesite em não o publicar.
Cerca do fim do mês conto poder escrever-lhe mais demoradamente.
Creia sempre na amizade e na admiração do
seu muito dedicado,
Fernando Pessoa.
Lisboa, 16 Out.o 1930.
Cartas de Fernando Pessoa a João Gaspar Simões. (Introdução, apêndice e notas do destinatário.) Lisboa: Europa-América, 1957 (2.ª ed. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1982).
- 49.