[Carta a Thomaz Colaço - 15 Fev. 1934]
Apartado 147,
Lisboa, 15 de Fevereiro de 1934.
Meu caro Thomaz Colaço:
Desculpe, novamente, a máquina, mas hoje estaria ilegível se escrevesse em verdadeiro escrever, dada a pressa com que tenho que fazer tudo.
Recebeu a minha carta, escrita há dias, dizendo que até ao fim da semana (a passada) receberia um novo escrito meu e uma nota em inglês — a tal que lhe convinha? Pois, quanto ao escrito, verifiquei definidamente que estou totalmente desadaptado de escrever com simplicidade. Já do nosso confrade William Shakespeare dizia alguém — o Guizot, creio — que conseguira escrever em todos os estilos, excepto o simples. Assim, ao menos, estou mal em boa companhia.
Acho melhor abster-me d'esse género de colaboração. Relendo, ainda ontem, para mim, O Homem de Porlock*, tal qual o escrevi, verifiquei a razão que v. tinha em me pedir para não ir mais longe em dificuldade, mas, ao mesmo tempo, a sua gentileza em me não indicar que tinha ido já longe de mais.
Quanto à tal nota em inglês, vou ver o que posso fazer. Conhecendo já melhor — de visu, por assim dizer, e porque é certo assim dizer — a índole de Fradique, talvez consiga arranjar qualquer coisa em inglês que se aproveite. Conto poder enviar-lhe essa tal nota até sábado, ou segunda-feira o mais tardar. Digo «talvez consiga» porque, por qualquer motivo que ignoro, consigo, em geral, ser mais simples em inglês do que em português. Acho que essa Nota deverá ser publicada sem assinatura, dada a sua índole e o fim a que se destina.
Não posso prometer-lhe que conseguirei, mas vou tentar.
Camarada admirador,
Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.
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