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Arquivo Pessoa

OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Ricardo Reis

Cedo demais vem sempre, Cloé, o inverno.

Cedo de mais vem sempre, Cloé, o inverno.

É sempre prematuro, inda que o espere

        Nosso hábito, o esfriar

        Do desejo que houve.

Não entardece que não morra o dia.

Não nasce amor ou fé em nós que não

        Morra com isso ao menos

        O não amar ou crer.

Todo o gesto que o nosso corpo faz

Com o repouso anterior contrasta.

        Nesta má circunstância

        Do tempo eternos somos.

Só sabe da arte com que viva a vida

Aquele que, de tão contínua usá-la,

        Furte ao tempo a vitória

        Das mudanças depressa,

E entardecendo como um dia trópico,

Até ao fim inevitável guie

        Uma igual vida, súbito

        Precipite no abismo.

7-7-1919

Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994.

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