As três tentativas para fazer governar as classes médias...
O Sentido do Sidonismo
As três tentativas para fazer governar as classes médias — João Franco, Pimenta de Castro, Sidónio país — acabaram, duas por um crime, e outra pela mais antinacional das revoluções portuguesas.
O conceito vulgar, de que foi o democratismo que nos fez entrar na guerra, é falso, como todos os conceitos vulgares.
Foi a Alemanha que nos declarou a guerra, após a "requisição", a que a G. B. nos forçou, dos barcos alemães. Os democráticos não são autores da nossa intervenção na guerra; são apenas autores da propaganda estéril a favor dessa entrada. Quem nos fez entrar na guerra foi a Alemanha, que no-la declarou, e a G. B. que nos forçou ao acto servil pelo qual essa declaração nos veio.
Os democráticos não eram tão falhos de senso político que quisessem meter na guerra um país em que não havia nenhum sentimento que solicitasse a ida para a guerra. Demonstrava isso um mau estado do país? Talvez; mas eu aponto o facto, por enquanto não o discuto.
A verdade é esta: em Portugal não havia ódio contra os alemães. Nenhuma tradição nossa o estabelecia; os nossos ódios tradicionais eram contra a Espanha, contra a França e contra a Inglaterra. A Alemanha nunca nos fora nada, nem num sentido nem noutro. Havia razões para odiarmos a Alemanha, para a temermos? Por certo, mas não razões susceptíveis de atingir a alma popular, não razões [...] àquelas que criam uma guerra nacional. "Esta guerra não é uma guerra nacional", disse Paiva Couceiro. Disse bem. Só se converteu em guerra nacional depois de termos tropas na frente de França, e, mesmo assim, era frequente regressarem oficiais e soldados que aludiam com mais simpatia ao "amigo boche" do que ao francês, e sobretudo ao inglês, camarada [?]. O contrário foi uma mixórdia da nossa desqualificada imprensa periódica, que nem soube de que (...) e lhe tinha sumido a decência.
Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979.
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