O ARQUIVO DE CORRESPONDÊNCIA
O ARQUIVO DE CORRESPONDÊNCIA
A organização dos arquivos, e principalmente do arquivo de correspondência entrada e saída — que é o principal —, é um dos pontos mais importantes da organização interna de qualquer escritório, seja industrial ou comercial.
Esta organização especial divide-se em três partes: o arquivo de correspondência entrada, o arquivo de correspondência saída e o arquivo de referência a estas duas. Esta divisão não quer dizer que haja necessariamente arquivos materialmente diferentes para a correspondência entrada e saída: quer dizer apenas que a correspondência entrada e a correspondência saída são dois aspectos a tratar separadamente, ainda que as cartas de uma e as cópias das cartas da outra se reunam sob as capas da mesma pasta ou do mesmo dossier.
Passamos a indicar os processos mais eficientes de arquivar e coordenar a correspondência entrada, a correspondência saída, e a referência a ambas. Muito contribui para a facilidade de trabalho de um escritório o ter uma boa organização, de fácil consulta, da sua correspondência.
Comecemos pelo que é fundamental. A correspondência, entrada e saída, tem que ser consultável por qualquer de três maneiras — por ordem cronológica, por firmas e por assuntos. E, como é de ver, a consulta, de qualquer das três maneiras, tem que ser o mais fácil e o mais perfeita possível.
Posto isto, e tendo isto sempre presente, entramos, orientadamente, no assunto.
Toda a correspondência, que entra num escritório, deve ser registada, para fins cronológicos, num livro destinado para esse fim. Nesse livro, e na própria carta (ou postal), devem ficar registados não só a data de entrada mas também dois números de entrada — um, por assim dizer, absoluto; o outro, por assim dizer, relativo. O primeiro número é um número de ordem da carta adentro de toda a correspondência; assim as cartas entradas numa ocasião são registadas com números seguidos, em seguimento do das cartas imediatamente anteriores, sendo, é claro, indiferente quais as cartas que tomam precedência de outras quando entram na mesma ocasião. O segundo número é um número de ordem da carta adentro da correspondência da casa que a escreveu. Um exemplo: determinada carta terá a data de recepção 13 de Abril de 1926, e os números 17565/122; quer dizer que esta carta é a 17565ª recebida pelo escritório, e a 122ª recebida da casa que a escreveu.
O primeiro número tem, em geral, apenas, a conveniência de dar à carta um sinal distintivo; e, de todos os sinais distintos, é o sinal numérico o mais simples. O segundo número tem um fim mais evidentemente prático: numeradas na devida ordem as cartas de uma firma, é fácil, retirada qualquer delas do arquivo, ou tendo esquecido ali verificar a sua falta, pois é sempre fácil verificar um salto de número.
É este, como é de ver, o sistema mais perfeito de registo imediato, e fiscalização futura, da correspondência entrada. Num escritório, porém, que receba todos os dias uma correspondência numerosíssima, e em que urgências de expediente obriguem a prestar a essa correspondência uma atenção imediata, pode parecer que a relativa morosidade deste registo, por depressa que seja feito, constituiu um impedimento do trabalho. Não há obstáculo real. É tudo uma questão de ordem, de disciplina e de adaptação às circunstâncias, que variam de escritório para escritório. Se o escritório tem secções, e a correspondência se pode dividir nitidamente por elas, o registo de entradas pode comportar a mesma seccionação e, dada a cada secção uma letra, a inscrição das cartas entradas pode obedecer a uma numeração seccional, sem prejuízo da numeração da carta adentro das da firma que as escreve. Assim a carta, em vez de ser numerada 17565/122, como no exemplo dado, será numerada B.3452/122, sendo B a secção e 3452 o número de ordem da carta adentro da correspondência entrada nessa secção. Se o escritório tem muita correspondência, mas não comporta divisões em secções, só haverá morosidade no registo de entradas se esse registo foi feito directamente num livro, e portanto por um só empregado. Se, porém, a numeração “absoluta” for feita por numerador mecânico — o que permite a um só empregado “despachar” rapidamente uma grande quantidade de cartas —, e o apontamento das firmas remetentes feito em seguida, em papéis soltos, e com a nota desse número, por diversos empregados, pode, executado esse trabalho, um empregado passar sossegadamente ao livro de entradas o resultado dele, sem em nada estorvar a atenção urgente que tenha que dar-se às cartas, pois já as não terá em seu poder. Faltará a aposição, nas cartas, do número a que chamámos “relativo”; mas esse, que o empregado pode verificar no livro de entradas, pelo exame de entradas anteriores, lança-o ele depois nas próprias cartas que, como será ele o encarregado do arquivo, lhe voltarão às mãos no decurso do dia para que as insira, ou faça inserir, nas respectivas pastas ou dossiers. Que, em matéria de organização, todos devem compenetrar-se de um princípio: nada é difícil nem complexo desde que haja método e ordem.
O livro de entrada de correspondência, a que temos estado aludindo, tem uma primeira coluna, onde se insere a data da entrada da carta; uma segunda coluna, onde se insere o número “absoluto” que recebe; uma terceira, onde vai o seu número “relativo”; uma quarta, que é para o nome da firma; e uma quinta, onde se regista a data da resposta (e/ou o número dela, se as cartas expedidas também são numeradas) ou a indicação de que não teve resposta, porque não tinha que tê-la. Esta última coluna tem a vantagem de que por ela, reparando nos espaços que estão em branco, imediatamente se verifica que cartas são aquelas a que falta responder.
Há só um elemento do livro de entrada de correspondência que exige uma certa atenção, para que lapsos não se dêem: é a numeração a que chamamos “relativa”. É fácil dar a uma carta, por engano, o mesmo número que o da carta anterior da mesma firma: basta que, ao procurar para trás, no livro de entradas, o nome da firma, se salte a última inserção. Mas contra isto há um remédio antecipado, que é muito simples. Ao dar entrada à carta de uma firma, sublinha-se, ou marca-se de qualquer outra maneira clara, o número da carta anterior; feito isto nunca haverá dúvidas sobre qual é o número da carta imediatamente anterior de uma firma — é aquele que ainda não está sublinhado ou marcado da maneira que se escolheu.
O género de erro, a que acabamos de aludir, dar-se-ia com firmas com quem houvesse correspondência frequente, ou quase frequente. Mas com firmas com quem não tivesse havido quase correspondência nenhuma, o mesmo erro se poderia dar, por uma razão oposta. Sendo difícil descobrir, por estar distante, uma carta anterior, ou a carta imediatamente anterior, da firma, é fácil cair-se no erro de supor que a carta entrada é a primeira carta que dela se recebe. Mas contra isto, também, há um remédio antecipado, e seguro. Todos os meses, e no fim de cada mês, se deve passar para o arquivo de fichas ou cartões a nota da correspondência entrada (como, aliás, também da saída). Essa nota será, sem dúvida, apenas uma inscrição numérica nas fichas ou cartões das firmas com quem, ou de quem, existe já correspondência. Para firmas que escrevam pela primeira vez será a abertura de ficha. Se isto se fizer, o encarregado do livro de entradas terá apenas, perante uma carta de firma que estranhe, que procurá-la, primeiro, entre as entradas do mês, e depois, caso ali a não houvesse encontrado, nas fichas do arquivo. Assim verificará, com facilidade e rapidez, que número “relativo” deve dar à carta que entrou.
É evidente, porém, que o livro de registo de correspondência entrada pode, pela inserção de mais duas colunas, tornar-se absolutamente seguro de consulta, qualquer que seja o fim com que se queira consultá-lo. As duas colunas referidas ficam entre a terceira (que é a do número “relativo” da carta) e a quarta (que é a do nome da firma). A primeira destas novas colunas regista o número “absoluto” da carta imediatamente anterior da firma; a segunda regista o número “absoluto” da carta imediatamente ulterior. É um género de registo absolutamente análogo ao que vulgarmente se faz nos copiadores para a correspondência expedida e neles copiada; ali se costuma escrever em cada página o número da página onde está a carta anterior da firma e o número da página onde está a carta seguinte.
Com o livro de entrada de correspondência assim completamente registado, e o sistema de fichas organizado como se disse, o registo de correspondência entrada fica fácil e imediatamente consultável para todos os fins que se imaginem.
A correspondência, uma vez entrada, fica logo em uma de três categorias: correspondência que não tem resposta, correspondência a responder no próprio dia, correspondência a responder mais tarde. Sobre o destino imediato da primeira e da segunda ninguém tem dúvidas nem hesitações; a primeira segue logo para o arquivo; a segunda segue para o arquivo pouco depois, feita que esteja a resposta — no fim do dia, ou na manhã seguinte, o mais tardar. É sobre o destino imediato da correspondência que aguarda resposta que se estabelece divergência. Uns são de opinião que essa correspondência se arquive imediatamente, como a outra, e se aponte de qualquer modo que há que responder-lhe. Outros são de parecer que essa correspondência se retenha, separada do arquivo, em pasta própria, até que a resposta se efectue.
Os argumentos em favor dos dois critérios dir-se-ia que se equilibram; a nosso ver, porém, a balança prática pende para o segundo, que é, aliás, o mais seguido, embora sem método. Arquivada a carta que tem resposta, embora não imediata, a necessidade de responder-lhe é lembrada, ou pelo livro de entradas (e da maneira a que já nos referimos), ou por apontamento especial. O livro de entradas, porém, deve estar em poder do encarregado
do arquivo, que não é, em geral, quem responde às cartas; a sua função, neste respeito, só poderá naturalmente ser, por assim dizer, fiscal. E quer o livro de entradas quer um apontamento especial são inferiores à própria carta tanto como elementos de lembrança como porque a própria carta não só se lembra mas é, detalhadamente, aquilo a que há que responder.
Parece-nos, pois, realmente preferível o sistema vulgar de reter fora do arquivo a correspondência que espera resposta. O que não nos parece preferível é o sistema que, aliás, não é nenhum — que se adopta para essa retenção em grande número de escritórios. Consiste ele em se guardarem essas cartas, sem ordem nem método, e em geral soltas, numa pasta de Assuntos Pendentes, ou coisa que o valha.
Este processo peca radicalmente contra dois dos princípios fundamentais da disciplina dos trabalhos de escritório: 1) não haver papéis soltos; 2) pôr por ordem tudo que possa ser posto por ordem. O problema é dos mais simples de resolver: 1) em vez de numa pasta, onde estejam soltas, as cartas ficam numa pasta onde estejam presas; 2) em vez de estarem dispostas ao acaso nessa pasta, estão por ordem alfabética, ou — o que também é ordem, mas pior — por ordem cronológica.
Estas considerações fecham o assunto “correspondência entrada”. Nem será preciso, por certo, lembrar que a carta recebida, ao entrar no arquivo, deve trazer indicada a data em que se lhe respondeu, ou o facto de que não tinha resposta.
A correspondência saída aparece no arquivo por meio da cópia ou cópias que dela se tiram. O primeiro problema que deparamos é, pois, o do processo de tirar essas cópias.
Antes do aparecimento da máquina de escrever não havia, para a cópia das cartas expedidas, processo mais prático que o chamado “copiador”, objecto hoje antipático e, onde o não impõem circunstâncias legais, obsoleto. Com efeito, por aborrecido, lento e imperfeito que seja o processo, por mais que se queira simplificá-lo, de passar, por água e prensa, uma carta ao copiador, ele é de todo o ponto preferível ao único outro processo de cópia antigamente conhecido — o traslado da carta, ou seja, o escrevê-la de novo para dela ficar um duplicado.
Com o advento da máquina de escrever e do seu companheiro, o papel químico, suprimiu-se, com ganho de tempo, de perfeição e de eficiência, a velharia do copiador. De tempo, porque no mesmo acto de escrever a carta ele se copia; de perfeição, porque não se emprega água, nem se corre portanto o risco frequente e fácil de se desfear a carta; de eficiência, porque se poderia tirar várias cópias ao mesmo tempo. A invenção do papel químico de cópia — isto é, do papel químico que dá uma cópia que se pode passar por água ao copiador — tornou possível, onde seja necessário que tal se dê, a conjugação do uso do papel químico com o uso do copiador; nem se perde tempo, pois a carta pode ser expedida imediatamente, visto que é a sua cópia, e não da, que é copiada naquele abominável livro.
Detestamos o copiador, cuja única vantagem (pois o ser exigido por lei, onde o é, o torna necessário mas não vantajoso) é que forma um registo cronológico automático da correspondência expedida. Onde, porém, tenha que ser usado, recomendamos que se use o papel químico de cópia para esse fim, tendo a máquina de escrever uma fita fixa, ou record; assim o aspecto da carta não sofrerá insulto nem haverá necessidade de demorar, uma vez ela assinada, a sua expedição.
Referimo-nos ao copiador como tendo a única vantagem de formar o registo cronológico da correspondência expedida. Em casas que têm forçosamente que empregá-lo, seria absurdo estabelecer outra espécie de registo cronológico, visto essa necessidade ter ao menos esta vantagem. Mas onde não haja necessidade de copiador, o registo cronológico da correspondência saída pode ser exactamente correspondente ao que indicámos para o da correspondência entrada — um livro onde a correspondência saída se regista da mesma forma que no outro se regista a correspondência entrada, e com igual sistema de alusão e de numeração. Quer dizer, a correspondência saída seria numerada do mesmo modo que a entrada, e estes números serviriam para a entre-referência de um livro para o outro: na coluna do livro da entrada que se destina à indicação de quando se respondeu inserir-se-ia o número da carta de resposta; na coluna do livro da saída que se destina à indicação de a quê se respondeu se inseriria o número da carta respondida, podendo ainda acrescentar-se, para elucidação inteira também o número da carta que veio em resposta depois. É evidente que este sistema de entre-referências se pode empregar também entre o copiador e o livro de registo da correspondência entrada.
Dissemos no princípio deste artigo — e agora o repetimos —que a correspondência, entrada e saída, tem que ser consultável por qualquer de três maneiras — por ordem cronológica, por firmas e por assuntos. Os dois livros — o de registo da entrada e o de registo da saída —, ou o primeiro livro e o copiador (este perfeitamente registado), estabelecem a consultabilidade por ordem cronológica ou, em outras palavras, formam o arquivo cronológico.Temos que estudar agora como se fazem o arquivo por firmas e o arquivo por assuntos.
O arquivo por firmas é de todos o mais importante, porque é o que essencial e frequentemente se consulta.É natural, pois, que em torno a ele surja um número maior de problemas que em torno aos outros dois.
Os elementos que constituem este arquivo são elementos directos — a carta que se recebe do correspondente, e a cópia, o papel químico, da carta que se lhe escreve. Quando se não tire mais que uma destas cópias, é para aqui que vai essa cópia única.
O primeiro problema que surge nesta matéria é se as cartas recebidas de uma firma e as cópias das cartas para ela devem arquivar-se conjunta e intercaladamente ou, embora juntas, em dois corpos separados. O primeiro processo é aquele em que as cartas e as cópias se arquivam misturadas, e por uma ordem cronológica determinada pelas datas de recepção das primeiras e as datas das cartas de que as segundas são cópias. No segundo processo, as cartas e as cópias firmam, como se disse, dois grupos separados, embora justapostos; e, adentro de cada grupo, segue-se, do mesmo modo, a ordem cronológica, aliás a única possível. O primeiro processo é o quase universalmente seguido; é, contudo, a nosso ver, o pior dos dois. São duas as desvantagens evidentes desse processo: como em geral o papel de cartas do correspondente e o papel de cópias da casa não tem o mesmo formato e corpo, dá-se uma irregularidade de arranjo que terna desagradável o manuseio, como o seria o de um livro que tivesse folhas de diferentes tamanhos; como, também, o que é mais frequentemente preciso é confrontar uma carta com a sua resposta, um sistema que não permita ter as duas lado a lado diante de nós, sem necessidade de desprender ambas de onde estão presas, embaraça muito essa consulta. O segundo processo evita ambos os inconvenientes; e, se tiver havido o cuidado de em cada elemento de um grupo marcar o número ou data de referência ao do outro, a entre-referência dos dois grupos será, não fácil, mas facílima. Só no caso de haver pouquíssima correspondência com uma firma se não tornaria fastidiosa a consulta pelo primeiro processo; mas esta excepção é precisamente daquelas que prova a regra, pois, quando há muito pouca correspondência, a consulta é sempre fácil, qualquer que seja o sistema, desde que se não percam as cartas ou se não arquive Zacarias na letra “B”.
O segundo problema que surge nesta questão é o do processo material de arquivo. Deve arquivar-se a correspondência por firmas em dossiers de um para cada firma? Deve arquivar-se em um dossier colectivo, dentro do qual as firmas se disponham por ordem alfabética? Deve adoptar-se um sistema misto, onde o primeiro processo se aplique para as firmas com quem há muita correspondência, e o segundo para aquelas com que a há pouca? Qualquer dos dois sistemas opostos tem vantagens, e o terceiro, que reúne os dois, reúne também em parte as vantagens dos dois. No primeiro sistema há mais facilidade e comodidade de consulta, sobretudo de consulta simultânea de cartas de firmas diferentes. No segundo sistema há mais simplicidade de arquivo, menor risco de desarrumação, a exigência de um espaço mais pequeno. A vantagem maior está, a nosso ver, no sistema misto, desde que se mantenha o dossier colectivo apenas para as firmas com quem há muito pouca correspondência, abrindo-se-lhes dossiers especiais logo que a correspondência comece a tomar algum vulto. E, como defendemos, por preferível, a doutrina da arquivação separada da correspondência recebida e das cópias da expedida, sustentamos que este princípio se mantenha tanto para o dossier colectivo como para os dossiers especiais. Haveria dois dossiers colectivos — um para a correspondência recebida, outro para as cópias da expedida. E para cada caso, cuja correspondência merecesse dossier especial, haveria igualmente dois desses dossiers, do mesmo modo divididos.
Distingui-los-ia a cor, sendo constante, através de todo o arquivo, uma cor para todos os dossiers de cartas recebidas e outra cor para os das cópias das cartas enviadas. A identidade de número (ou de nome) nas capas os agruparia a dois e dois.
Em tudo isto se trata, evidentemente, apenas da correspondência corrente e próxima; a disposição da correspondência passada, isto é, de anos anteriores, constitui outro problema, de que mais adiante trataremos.
O terceiro problema é o da disposição das cartas ou cópias dentro dos dossiers. Devem estar soltas, para que a carta ou cópia fique sem defeito, e a consulta seja fácil? Devem estar presas, para que não seja fácil misturarem-se ou caírem? As vantagens pode dizer-se que se equilibram, porém é conveniente não esquecer que o evitar papéis soltos é um dos elementos de boa ordem em qualquer escritório e, ainda, que a presença de postais e papéis de formato irregular, entre a correspondência, torna fácil a mistura quando ela não esteja presa. Aliás, uma das principais objecções à prisão das cartas e das cópias — mas principalmente das cartas — é aplicável somente ao processo de prisão mais seguido, que é por perfuração. Há processos de prisão de cartas em que se não usa a perfuração, mas a pressão. A perfuração, porém, não tem grandes desvantagens, salvo no caso de postais ou cartas sem margem, em que é difícil não perfurar o texto. Nestes casos, que são relativamente raros, basta colar a carta ou o postal a um papel forte — e transparente, se for preciso — e perfurar este para a fixação no arquivo.
O quarto problema é o da velha questão que surge não só neste caso, mas em todo o caso de classificação alfabética de designações compostas de vários nomes: qual é o nome que determina preferivelmente a classificação? Por exemplo: a firma A. J. Silva & Costa, Lda., deve classificar-se em A. J., em Silva, ou em Costa? Não há critério logicamente preferível; adopte cada qual o que preferir. O essencial, porém, é que, adoptado um, se adopte sempre esse; e o risco de erro será reduzido se o arquivo, por firmas, de cartas tiver o seu complemento (como deve ter, e pelas razões abaixo expostas) num arquivo de fichas ou cartões relativos a essas firmas; de cada firma se podem fazer tantos cartões de referência quantas sejam as maneiras por que se pode classificar o nome da firma, e os cartões puramente referenciais limitar-se-ão a referir para o cartão com o nome da firma na disposição em que a classificámos.
O quinto problema é o da organização do arquivo de correspondência passada (isto é, de anos anteriores) e das suas relações com o arquivo de correspondência corrente. E a correspondência recente que precisa de ser constantemente consultada; a passada só ocasionalmente o tem que ser. O arquivo de correspondência divide-se, pois, em duas partes — a que deve ser disposta e organizada para fácil consulta imediata; e a que deve estar convenientemente arrumada para consulta pouco morosa em qualquer ocasião. Já tratámos da disposição da correspondência recente, quando estudámos — foi o segundo problema nesta matéria — o “processo material de arquivo”. Resta agora que tratemos do arquivo permanente da correspondência e das suas relações com o arquivo corrente. A grande maioria das casas estabelece o arquivo permanente da correspondência por classificação cronológica: agrupa em “arquivos” relativos a anos, semestres, ou outros quaisquer períodos, e por ordem alfabética de firmas dentro de cada “arquivo”, as cartas recebidas, e as cópias das cartas expedidas, durante esse período.
Repudiamos este sistema porque vai contra o próprio princípio do arquivo de correspondência: o ser ele primariamente um arquivo por firmas, e não por ordem cronológica. A nosso ver — e nisto somos coerentes com tudo quanto aqui temos exposto —, o arquivo permanente de correspondência deve obedecer a princípios idênticos aos do arquivo corrente. Em primeiro lugar, em vez de “arquivos” largos e pesados, deve havê-los mais pequenos, porque a comodidade é uma facilitação, e, portanto, um elemento vantajoso na organização. Em segundo lugar, e para cada firma com que há correspondência em certo vulto, deve um “arquivo” ser empregado para a correspondência dela em determinado período, havendo também um “arquivo” idêntico (diferente apenas na cor da capa) para as cópias das cartas para essa firma no mesmo período. Cada um desses “arquivos” terá exteriormente um número, correspondente permanentemente à firma; e os arquivos sucessivos terão uma numeração acessória sucessiva, por exemplo, 23/1, 23/2, 23/3, etc. Para as firmas se manterá o mesmo princípio que no arquivo corrente: agrupá-las em dossiers maiores e ir distribuindo por dossiers menores à medida que a correspondência for tomando vulto.
A relação entre o arquivo de correspondência antiga e o de correspondência corrente estabelece-se por meio de fichas ou cartões. Como se viu, o mais conveniente é que cada firma tenha um número, e que com esse número se marque tudo que diz respeito a essa firma. O sistema de fichas ou cartões estabelece a passagem dos nomes para os números e, com isso, agrupa e relaciona automaticamente o arquivo das cartas passadas e o arquivo da correspondência corrente.
Estas considerações esgotam o arquivo por firmas, no que há nele de problemas realmente fundamentais. Falta agora tratar do arquivo por assuntos. Na altura em que vamos da explicação da matéria, pouco é preciso dizer a este respeito. Como as cartas recebidas têm que ser arquivadas no arquivo por firmas, e como em cada carta, recebida ou expedida, se pode tratar de mais de um assunto, o arquivo por assuntos deve ser um arquivo por cartões ou fichas, com referências concisas e fáceis às cartas onde os assuntos se tratam. Dado o já exposto, porém, tudo isto é intuitivo. A esse respeito, portanto, nada de especial há que dizer.
Páginas de Pensamento Político. Vol II. Fernando Pessoa. (Introdução, organização e notas de António Quadros.) Mem Martins: Europa-América, 1986.
- 158.1ª Publ. in Revista de Comércio e Contabilidade, nº 4. Lisboa: 25-4-1926.