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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

Meu coração tardou. Meu coração

Meu coração tardou. Meu coração

Talvez se houvesse amor nunca tardasse;

Mas, visto que, se o houve, o houve em vão,

Tanto faz que o amor houvesse ou não.

Tardou. Antes, de inútil, acabasse.

Meu coração postiço e contrafeito

Finge-se meu. Se o amor o houvesse tido,

Talvez, num rasgo natural de eleito,

Seu próprio ser do nada houvesse feito,

E a sua própria essência conseguido.

Mas não. Nunca nem eu nem coração

Fomos mais que um vestígio de passagem

Entre um anseio vão e um sonho vão.

Parceiros em prestidigitação,

Caímos ambos pelo alçapão.

Foi esta a nossa vida e a nossa viagem.

19-9-1933

Novas Poesias Inéditas. Fernando Pessoa. (Direcção, recolha e notas de Maria do Rosário Marques Sabino e Adelaide Maria Monteiro Sereno.) Lisboa: Ática, 1973 (4ª ed. 1993).

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