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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Álvaro de Campos

Os antigos invocavam as Musas.

Os antigos invocavam as Musas.

Nós invocamo-nos a nós mesmos.

Não sei se as Musas apareciam —

Seria sem dúvida conforme o invocado e a invocação. —

Mas sei que nós não aparecemos.

Quantas vezes me tenho debruçado

Sobre o poço que me suponho

E balido «Ah!» para ouvir um eco,

E não tenho ouvido mais que o visto —

O vago alvor escuro com que a água resplandece

Lá na inutilidade do fundo...

Nenhum eco para mim...

Só vagamente uma cara,

Que deve ser a minha, por não poder ser de outro.

É uma coisa quase invisível,

Excepto como luminosamente vejo

Lá no fundo...

No silêncio e na luz falsa do fundo...

Que Musa!.

3-1-1935

Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993).

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