Fernando Pessoa
Monólogo nas Trevas
Monólogo nas Trevas
A qualquer modo todo escuridão
Eu sou supremo. Sou o Cristo negro.
O que não crê, nem ama — o que só sabe
O mistério tornado carne —.
Há um orgulho atro que me diz
Que sou Deus inconscienciando-se
Para humano; sou mais real que o mundo.
Por isso odeio-lhe a existência enorme,
O seu amontoar de coisas vistas.
Como um santo devoto
Odeio o mundo, porque o que eu sou
E que não sei sentir que sou, conhece-o
Por não real e não ali.
Por isso odeio-o —
Seja eu o destruidor! Seja eu Deus ira!
s.d.
“Primeiro Fausto” in Poemas Dramáticos. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática, 1952 (imp.1966).
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