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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Ricardo Reis

XIV - De novo traz as aparentes novas

De novo traz as aparentes novas

Flores o Verão novo, e novamente

        Verdesce a cor antiga

        Das folhas redivivas.

Não mais, não mais dele o infecundo abismo,

Que mudo sorve o que mal somos, torna

        À clara luz superna

        A presença vivida.

Não mais; e a prole a que, pensando, dera

A vida da razão, em vão o chama,

        Que as nove chaves fecham

        Da Estige irreversível.

O que foi como um deus entre os que cantam,

O que do Olimpo as vozes, que chamavam,

        Escutando ouviu, e, ouvindo,

        Entendeu, hoje é nada.

Tecei embora as, que teceis, grinaldas.

Quem coroais, não coroando a ele?

        Votivas as deponde,

        Fúnebres sem ter culto.

Fique, porém, livre da leiva e do Orco,

A fama; e tu, que Ulisses erigira,

        Tu, em teus sete montes,

        Orgulha-te materna,

Igual, desde ele, às sete que contendem

Cidades por Homero, ou alcaica Lesbos,

        Ou heptápila Tebas,

        Ogígia mãe de Píndaro.

22-10-1923

Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994).

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1ª publ. in Atena , nº 1. Lisboa: Out. 1924.