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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Álvaro de Campos

MENSAGEM AO DIABO

MENSAGEM AO DIABO

É preciso criar abismos, para a humanidade que os não sabe saltar se engolfar neles para sempre.

Criar todos os prazeres, os mais artificiais possível, os mais estúpidos possível, para que a chama atraia e queime.

O problema da sobrepovoação, o problema da sobreprodução eliminam-se criando-se focos de eliminação humana (por meio de todos os vícios), criando focos de inércia humana (por meio de todas as seduções). Fazer suicidas, eis a grande solução sociológica.

É facil ouvir de qualquer megera limpa que «não crê na Lei de Cristo», é animá-la em seguir a não-lei de Cristo. Em três anos está gasta e finda, e então descobre que o pior de não seguir a lei de Cristo é que os outros a não seguem também. E o caixote do lixo recebe-a como às teorias dos mestres a quem ela ensinou.

É nosso dever de sociólogos untar o chão, ainda que seja com lágrimas, para que escorreguem nele os que dançam.

E comunistas, batonnières dos beiços, humanitários, cultos do internacionalismo - tudo isso colabora ardentemente na eliminação deles mesmos que se precisa. Depois, dos recantos das províncias, onde tomam chá com a família, ou lavram as terras sem teorias nem desejos, os fortes surgem e a civilização continua.

Porque sempre a Realidade é um bocado de sol simples, um quintal herdado e a certeza de ser um indivíduo.

s.d.

Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990.

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