Todo o mundo de seres e relações
Todo o mundo de seres e relações
Aos meus olhos (...) se dissolve
Em irrealidades e vazias
Admirações de ser. Espanta-me
De ver que há existência e existências.
E reflectindo perco-me em profundos
Pensamentos, bases uns doutros ainda
Mais profundos, até nada entender.
Tenho quase um sorriso ao ver-te, mundo,
Existir — sóis, estrelas, firmamentos,
Extensões que sufocam de terror,
Cidades, palácios (...)
Poetas (...) — ah, que diversidades
E tudo sendo. O mistério do mundo,
O íntimo, horroroso, desolado,
Verdadeiro mistério da existência
Consiste em haver esse ou um mistério!
É esta a fórmula que encerra tudo...
Todo o vácuo e horror do pensamento
E que profundamente ponderar
Não podemos sem dores de terror
E esvaimentos d'alma de pensar.
Fausto - Tragédia Subjectiva. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988.
- 56.1ª versão inc.: “Primeiro Fausto” in Poemas Dramáticos. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática, 1952 (imp.1966, p.87).