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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

Esta lei de imprensa pouco tem sido atacada.

Esta lei de imprensa pouco tem sido atacada.

Claro está que uma injustiça nem por ser sociologicamente justificável deixa de ser uma injustiça.

Mostra que o sr. dr. Af[onso] C[osta] não tinha realmente a noção do que era a dignidade da imprensa. Acordamos quanto a essa noção que era difícil obtê-la experimentalmente em Portugal, e mesmo no estrangeiro, onde as coisas estão, em geral, [...] piores. Mostra também que o culto [?] [...] da justiça é tão obtuso para o que seja o papel da imprensa — ainda que esse papel seja o que ela nunca preenche — em que ele falava, e em que o Mundo falou. Os seus argumentos contra a lei de imprensa nem por serem certos (alguns) deixavam de ser argumentos de deputado da oposição, e não de deputado do povo. Atacar um p[rojecto] de lei em nome de certos princípios e evitá-los ao legislar no assunto; dizer na oposição uma coisa e servindo-se de certa espécie de ideias que [...] dizem morais, e intelectuais mesmo, e chegar ao poder e fazer nitidamente o contrário — o que é isto senão monarquismo e monarquismo puro, do monarquismo que nos trouxe ao estado em que estamos e que, criticando-se [?] na república em certos países que inconscientemente (...)

"Dignidade de imprensa", "saudosismo", (...) — [...] aguentaram o Sr. Dr. Af[onso] Costa, quando eminente parlamentar. Com estas ideias verbalmente morais e justas agredia ele com o aplauso de muita gente, incluindo alguns entendidos, e outros entendidos, no sentido em que entendidos se entendem.

(...)

Tão falho nisto de intenções sérias e de sentimentos justos, como havemos de supor que em outros assuntos, ainda que os resolva a sabor da maioria (...), não os resolva atrapalhadamente e apenas com o fito imoral de agradar e (...)?

Se precisamente o Sr. V. F. [...] intenções (...) na lei de imprensa, na de associação [?] e outras é o que nos dá o direito de concluir que o augusto (...) nas opiniões do exército era um estratagema, uma tentativa de solução legal e não uma manifestação do espírito justiceiro ou interessado, como não ver que o caso do Sr. Afonso Costa — barrete frígio à parte — é o mesmo precisamente que a lei de imprensa (a lei ultra-celerada) trai um estado de alma que não se coaduna com a atribuição ao indivíduo, cujo é a alma que tem esse estado, de intenções inteiramente incompatíveis com um desejo sincero de servir o país, o povo, entendendo-se por país [...] não só aquela parte do território nacional que está fora das paredes da casa do Sr. Dr. Afonso Costa — [...] Benfica — (...), e por povo toda a gente portuguesa, no número da qual entram, além do Sr. Afonso Costa e da sua família, os restantes membros da nossa nação, incluindo o Sr. (...) e o Sr. Homem Cristo.

s.d.

Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979.

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