A civilização a que pertencemos assenta em quatro fundamentos:
A civilização a que pertencemos assenta em quatro fundamentos: a Cultura Grega, a Ordem Romana, a Moral Cristã, a Universalidade Moderna, esta última criada pela Itália, quanto à formação de nacionalidades distintas, que nela primeiro emergiram em semelhança dos estados-cidades dos gregos e romanos; por Portugal, pelos descobrimentos, quanto à conversão da simples civilização europeia em civilização mundial; pela Inglaterra (...)
A civilização a que todos pertencemos — entendendo por “todos” todo o mundo — assenta em três fundamentos, que a precederam. Esses fundamentos são a Cultura Grega, a Ordem Romana, e a Moral Cristã. Da Grécia nos vem o espírito e a forma da nossa cultura. De Roma nos vem o espírito e a forma da nossa política. Da religião de Cristo nos vem o espírito e a forma da nossa vida interior.
A estes três fundamentos originais da civilização, primeiro da Europa, depois do mundo inteiro, se ajuntou, desde o fim da Idade Média e princípio da Renascença, um quarto fundamento. É difícil de lhe dar um só nome, mas esse nome poderá ser a Liberdade Europeia, porque os três movimentos criadores que o formaram tendem todos, ainda que diversamente, para uma libertação do homem.
O primeiro movimento começou na Itália e consistiu, através da renovação do espírito grego, na destruição da fraternidade humana, quer pela formação de nacionalidades, quer pelo movimento anti-romano que, por um lado progressivamente destituiu a língua latina de língua da humanidade civilizada, e, por outro lado, preparou a reforma, que haveria de destruir a fraternidade católica da Europa. Assim Europa se libertou do excesso de Roma e da Humanidade. É contra a humanidade que se faz todo progresso; por isso é reaccionário todo movimento, como o bolchevista, em que se pretenda introduzir a ideia fuste de humanidade.
O segundo movimento começou em Portugal, e foi o dos Descobrimentos. Pouco importa discutir se tal ou tal outro ponto da terra era ou não era conhecido antes de o descobrirem os Portugueses. Os descobrimentos dos Portugueses não valem como descoberta, mas como sistema. Foi Portugal que primeiro sistematizou a descoberta e revelação do mundo. Sociologicamente, pois, os descobrimentos (sejam os de espanhóis, de franceses, de ingleses, ou de quem quer que seja) são todos portugueses. Historicamente, serão o que forem; a história porém não é nada, senão (não é mais que) o armazém de factos ou pseudofactos sobre os quais trabalhe a sociologia.
O primeiro movimento começou na Itália, e teve um triplo aspecto, nem todo ele realizado na mesma Itália que o iniciou. Representa a libertação do homem das peias teológicas, pela colocação da arte e da filosofia fora do alcance da teologia e da moral. Isto começou a Itália pela reintrodução do espírito pagão que é a base (pela cultura grega) da nossa civilização. Representa a libertação do homem das peias humanitárias, pela criação, marcadamente clara nas cidades-estados de Itália, mas paralelamente desenvolvendo-se em toda a Europa, das nacionalidades distintas, criando cada vez mais rivalidades, desfraternizando progressivamente a humanidade como o progresso exige. Representa finalmente a libertação do homem (...)
Ultimatum e Páginas de Sociologia Política. Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Morão. Introdução e organização de Joel Serrão.) Lisboa: Ática, 1980.
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