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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

A República veio muito cedo.

Da Ditadura à República

A República veio muito cedo. Não é que o partido republicano estivesse mal organizado; se o estivesse não teria vencido. Não é que estivesse organizado numa orientação má — não era a melhor, mas era, com referência aos outros, a melhor, por certo.

O que o partido republicano não estava é suficientemente nacionalizado. Era insuficientemente português, posto que insuficientemente republicano.

Aquele espírito português que surge, evidente e nítido, na obra dos poetas, desde António Nobre a Afonso Lopes Vieira — esse entrava mediocremente na composição do psiquismo geral do partido da República. É justamente aquela parte do partido que mais se integrou no sentimento nacional português — a que representa António José d'Almeida — essa era, essencialmente, a mais sã, a mais patriótica e a mais (...) do partido. A outra — a que tinha por chefes B[ernardino] M[achado] e Afonso Costa — essa era mais meramente política, mais especialmente ocupada em fazer política contra a monarquia do que patriotismo pela República. Representam o ódio à monarquia, substituto positivo, porque todos os substitutos são positivos; mas envolvendo uma ideia negativa. Os outros — os da chefia de António José d’Almeida tinham o ódio à monarquia por causa do amor à República. Na boca do chefe a palavra povo tem uma significação nacional, ou tinha (...) que nas bocas dos outros — mera fórmula contrastada à de "monarquia" — não tinha (nem tem). A frase "povo português" dita pelo Dr. António José d'Almeida traz consigo hoje um momento de poesia num vago sabor com reflexo (...)

s.d.

Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979.

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