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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

Eu procurei primeiro o pensamento,

Eu procurei primeiro o pensamento,

Eu quis, depois, a imortalidade...

Um como o outro só deram ao meu ser

A sombra fria dos seus vultos negros

Na noite eterna longe dos meus braços...

Eu procurei depois o amor e a vida

P'ra ver se ali esqueceria a dor

Do pensamento e da ciência firme

Da certeza da morte. Mas o amor

É para quem guardou a alma inteira,

E não podia haver amor pr'a mim.

Depois na acção cega e violenta, onde eu

Afogasse de vez toda a consciência

Da vida, quis lançar meu frio ser...

Mas aquilo da alma condenada

Que me fizera em tudo um espectador,

De mim, do mundo, do que quer que fosse,

Proibiu-me outra cousa que assistir

Aos [...] dos outros e aos meus

Friamente de fora, sempre tendo

No fundo do meu ser o mesmo horror...

Ah, mas cansei a dor dentro de mim...

E hoje tenho sono do meu ser...

Dormir, dormir, de dentro d'alma, como

Um Deus que adormecesse e cujo sono

Fora um repouso de tamanho eterno

E feliz absorção em infinito

De inconsciência boa.

s.d.

Fausto - Tragédia Subjectiva. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988.

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