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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

Monólogo à Noite

                Monólogo à Noite

Tenha eu a dimensão e a forma informe

Da sombra e no meu próprio ser sem forma

Eu me disperse e suma!

Toma-me, ó noite enorme, e faz-me parte

Do teu frio e da tua solidão,

Consubstancia-me com os teus gestos

Parados, de silêncio e de incerteza,

Casa-me no teu sentido de (...)

E anulamente... Que eu me torne parte

Das raízes nocturnas e dos ramos

Que se agitam ao luar... Seja eu p'ra sempre

Uma paisagem numa encosta em ti...

Numa absoluta e (...) inconsciência

Eu seja o gesto irreal do teu beijo

E a cor do teu luar nos altos montes

Ou, negrume absoluto teu, que eu seja

Apenas quem tu és e nada mais...

Suspende-me no teu aéreo modo,

Comigo envolve as estrelas e espaço!

E que o meu vasto orgulho se contente

De teu ter infinito, e a vida tenha

Piedade por mim próprio no consolo

Da tua calma inúmera e macia...

s.d.

Fausto - Tragédia Subjectiva. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988.

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