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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Ricardo Reis

Seguro assento na coluna firme [ 3]

Seguro assento na coluna firme

        Dos versos em que fico.

O criador interno movimento

        Por quem fui autor deles

Passa, e eu sobrevivo, já não quem

        Escreveu o que fez.

Chegada a hora, passarei também

        E os versos, que não sentem

Serão a única restança posta

        Nos capitéis do tempo.

A obra imortal excede o autor da obra;

        E é menos dono dela

Quem a fez do que o tempo em que perdura.

        Morremos a obra viva.

Assim os deuses esta nossa regem

        Mortal e imortal vida;

Assim o Fado faz que eles a rejam.

        Mas se assim é, é assim.

Aquele agudo interno movimento,

        Por quem fui autor deles

Primeiro passa, e eu, outro já do que era,

         Póstumo substituo-me.

Chegada a hora, também serei menos

        Que os versos permanentes.

 E papel, ou papiro escrito e morto

        Tem mais vida que a mente.

Na noite a sombra é mais igual à noite

        Que o corpo que alumia.

29-1-1921

Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994.

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