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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

Há quanto tempo não canto

Há quanto tempo não canto

Na muda voz de sentir.

E tenho sofrido tanto

Que chorar fora sorrir.

Há quanto tempo não sinto

De maneira a o descrever,

Nem em ritmos vivos minto

O que não quero dizer...

Há quanto tempo me fecho

À chave dentro de mim.

E é porque já não me queixo

Que as queixas não têm fim.

Há tanto tempo assim duro

Sem vontade de falar!

Já estou amigo do escuro

Não quero o sol nem o ar.

Foi-me tão pesada e crescida

A tristeza que ficou

Que ficou toda na vida.

Para cantar não sonhou.

14-6-1930

Poesias Inéditas (1919-1930). Fernando Pessoa. (Nota prévia de Vitorino Nemésio e notas de Jorge Nemésio.) Lisboa: Ática, 1956 (imp. 1990).

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