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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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Fernando Pessoa

B. Ah, compreendo-te, compreendo-te.

B. Ah, compreendo-te, compreendo-te. Tu é que me não amas. Amas em mim o teu filho futuro.

A. Não, tu é que me não compreendes, tu não compreendes a mulher. Amo-te e amo em ti o pai do meu filho futuro. São duas cousas que eu amo em ti. Se não tivéssemos filhos eu não deixaria de te amar. Como queres compreender as mulheres se te julgas superior a elas? (...)

B. Ah, mas tu não me amas por uma razão pura. O que tu amas é o lar que eu te darei — eu, o marido, o filho que vier, a casa, o arranjo da casa, a companhia que faremos um ao outro, os amigos que, casal, teremos... (...) Vê como somos diferentes! Tu amas-me porque precisas de mim; eu amo-te porque me não és precisa. Amas-me com amor baixo com que se amam as cousas essenciais, eu amo-te com o alto amor com que se amam as cousas supérfluas.

A. Supérfluas! Que (...) me não podes amar! Ai de ti se eu te amasse como tu julgas (...) e alto. Ai dos homens se nós amássemos assim! O supérfluo é o que se pode deitar fora. Ninguém pensa em levar o supérfluo para o céu... Quando uma mulher ama, o homem que ama [...]

1913

«Diálogo no Jardim do Palácio». Ficção e Teatro. Fernando Pessoa. (Introdução, organização e notas de António Quadros.) Mem Martins: Europa-América, 1986

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1ª publ. in Fernando Pessoa et le Drame Symboliste. Teresa Rita Lopes. Paris: F. C. Gulbenkian, 1977