Fernando Pessoa
VI - Ó sono — Oh! ilusão! — o sono?
VI
O sono — Oh, ilusão! — o sono? quem
Logrará esse vácuo ao qual aspira
A alma que, de aspirar em vão, delira,
E já nem força para querer tem?
Que sono apetecemos? O d'alguém
Adormecido na feliz mentira
Da sonolência vaga que nos tira
Todo o sentir no qual a dor nos vem?
Ilusão tudo! Querer um sono eterno,
Um descanso, uma paz, não é senão
O último anseio desesperado e vão.
Perdido, resta o derradeiro inferno
Do tédio intérmino, esse de já não
Nem aspirar a ter aspiração.
27-02-1909
Obra Poética e em Prosa. Vol. I. Fernando Pessoa. (Introdução, organização, biobibliografia e notas de António Quadros e Dalila Pereira da Costa.) Porto: Lello, 1986.
- 157.«Em Busca da Beleza».