Fernando Pessoa
MAR. MANHÃ
MAR. MANHÃ
Suavemente grande avança
Cheia de sol a onda do mar;
Pausadamente se balança,
E desce como a descansar.
Tão lenta e longa que parece
De uma criança de Titã
O glauco seio que adormece,
Arfando à brisa da manhã.
Parece ser um ente apenas
Este correr da onda do mar
Como uma cobra que em serenas
Dobras se alongue a colear.
Unido e vasto e interminável
No são sossego azul do sol,
Arfa com um mover-se estável
O oceano ébrio de arrebol.
E a minha sensação é nula,
Quer de prazer, quer de pesar...
Ébria. de alheia a mim ondula
Na onda lúcida do mar.
16-11-1909
Obra Poética e em Prosa. Vol. I. Fernando Pessoa. (Introdução, organização, biobibliografia e notas de António Quadros e Dalila Pereira da Costa.) Porto: Lello, 1986.
- 157.