A propaganda, no sentido lato, de um lugar como a Costa do Sol,
A propaganda, no sentido lato, de um lugar como a Costa do Sol, assenta em três princípios: (a) o clima e vantagens directas, (b) a facilidade de comunicações e atractivos sociais, e (c) a publicidade. Esta última, como é de ver, baseia-se nas duas outras, embora deixando livre um campo que elas não abrangem — que é o que na publicidade há de próprio, e, ainda, o que, derivado do país em geral ou de outra qualquer matéria externa ao assunto, se pode fazer incidir, um pouco arbitrariamente, sobre ele.
O que diz respeito ao clima e as vantagens derivadas dele e a ele análogas, existe em si mesmo e não pode ser estimulado nem forçado. O que diz respeito aos atractivos a criar, assim como às facilidades de transporte e acomodação, é assunto, ou antes são assuntos de que me não proponho tratar. Cingir-me-ei ao caso da publicidade propriamente dita.
A publicidade de um lugar como a Costa do Sol pode e deve ser encarada sob dois aspectos — o do público a atingir, e o dos processos a empregar (excluindo os atractivos já excluídos) para o atingir.
O público a atingir é divisível em três categorias — (a) o público em geral, o vago público possível, qualquer que seja e sem que se determine nele divisão ou classificação alguma; (b) o público rico e luxuoso, em que é próprio viajar, e que, deste modo, se distingue e se destaca, para o caso particular de que se trata, do público em geral; e (c) o público especial composto de élites, artistas, intelectuais, e outros assim, que, se per si não vale muito, vale todavia pela influência que dele irradia sobre o público rico, em primeiro lugar, sobre todo o público, em segundo.
Os processos a empregar são, por sua vez, divisíveis em três categorias também: (a) a publicidade indirecta, isto é, jornalística, representada por anúncios insertos em publicações estrangeiras, pois que a estrangeiros principalmente se dirige; (b) a publicidade directa, constituída por folhetos, dobrantes e outras publicações da mesma ordem, ou enviadas a pessoas ou entidades escolhidas por via postal espontânea, ou enviadas em consequência de anúncios dispostos para a solicitar; (c) a publicidade translata, que, sem ter aparentemente uma relação directa com o assunto, em todo o caso o inclui e o torna simpático por meio das circunstâncias de que o cerca.
Ora, aplicando uma coisa a outra, temos que a publicidade de anúncios se dirige ao público em geral, que a publicidade de folhetos e impressos especiais se dirige em parte ao público em geral (aquele a quem os anúncios suscitam a pedir esses impressos ou que os pode ver em lugares públicos ou para tal fim considerados públicos) e em parte ao público rico (a quem seriam feitas remessas especiais, cuidadosamente escolhidas): e que a publicidade translata se aplica especialmente ao público artista e aquela parte do público que o não seja, mas que com ele de algum modo confine.
Toda a publicidade, seja qual for a destas espécies a que pertença, deve ser feita em obediência a três princípios: (a) o primeiro, que é o princípio essencial da publicidade, deve ser de esconder o mais possível, ou de tornar o mais agradável possível, o intuito publicitário; (b) o segundo é que a publicidade deve ser feita em línguas separadas. Nunca um folheto deve ser impresso em mais que uma língua. Nada há mais antipático que o poliglótico impresso. Repugna já em obras técnicas, que muitos se vêem forçados a ler; quanto mais não repugnará em folhetos que se deseja que se leiam! (c) O terceiro é de que toda a publicidade, seja qual for, deve fazer o possível por cingir-se de um âmbito de elegância, o que, se em certo modo quer dizer — como em (a) — o disfarce da publicidade, também quer dizer [...]
Páginas de Pensamento Político. Vol II. Fernando Pessoa. (Introdução, organização e notas de António Quadros.) Mem Martins: Europa-América, 1986.
- 173.1ª publ. in Fernando Pessoa - O Comércio e a Publicidade. António Mega Ferreira. Lisboa: Cinevoz/Lusomedia, 1968