Neste «Cancioneiro», e assim neste livro como em outros,
Neste «Cancioneiro», e assim neste livro como em outros, que porventura se lhe sigam, sirvo-me de dois artifícios de disposicão, que há razão talvez para explicar aos leitores.
A maioria dos poemas não têm títulos; os que os têm, têm-nos impressos em tipo menor, como se foram epígrafes. Nenhum dos poemas tem data, porém indico em apêndice especial as datas, exactas ou aproximadas, de todos eles.
As razões para estas duas inovações são, quanto à primeira, que o título, sendo importante ou mesmo essencial em as artes que não contêm em si toda a explicação, não é preciso, senão ocasionalmente, em literatura, onde o texto deve ordinariamente dizer tudo; quanto à segunda, que a data, como também o tempo que um poema leva a compor, nada tem com o mesmo poema, sendo tão somente um elemento de interesse psicológico, que, fornecido como tal ao leitor, força é que se lhe forneça separado do poema, para cuja estimação não tem que entrar.
Adopto uma ortografia etimológica extrema, cuja explicação perfeita não pode ser feita em palavras resumidas. Como em nada sofre, com ela, a leitura dos poemas, abstenho-me sequer de resumir essa explicação.
Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1996.
- 429.Prefácio para o «Cancioneiro»