Proj-logo

Arquivo Pessoa

OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
pdf
Fernando Pessoa

Monólogo na Noite

                Monólogo na Noite

Sou a Consciência em Ódio ao inconsciente.

Sou um símbolo encarnado em dor e ódio

Pedaço d’alma de possível Deus

Arremessado para o mundo

Com a saudade pávida da pátria

A cujo horror tremo ao pensar voltar

Mas sem nada da (...) e da ilusão

Para viver neste desterro. Amor,

Paz, amizade, tudo quanto ajuda

A viver a mentira do universo

Falha-me e eu (...)

Ó sistema mentido do universo

Estrelas-nadas, sóis irreais

Oh com que ódio carnal e estonteante

Meu ser de desterrado vos odeia.

Eu sou o inferno. Sou o Cristo negro

Pregado na cruz ígnea de mim mesmo

Sou o saber que ignora;

Sou a insânia da dor e do pensar

Sobre o livro de horror do mundo.

Por que fui eu, amaldiçoado horror

Que me fizeste ser e que eu nem posso

Pensar para te amaldiçoar, ou crer

Em ti, tão cheio do consciente e mensurante

Que o ódio me não cegue para ver

Que não sei que tu és para saber

Se sequer poderei pensar odiar-te.

s.d.

Fausto - Tragédia Subjectiva. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988.

 - 112.

1ª versão inc.: “Primeiro Fausto” in Poemas Dramáticos. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática, 1952 (imp.1966, p.86).