IMPERMANENCE - A mesquinhez
IMPERMANENCE
A mesquinhez, a estreiteza imaginativa são os vícios definidores da nossa época.
Somos incapazes de escrever, ou de querer escrever, ou de saber ler sem escrever, epopeias. Em compensação, escrevemos romances.
O romance é o conto de fadas de quem não tem imaginação. Todos nós, ou inferiores, ou em momentos de inferioridade, sonhamos com atitudes (...) da vida real. Sonhamos também, é certo, com o longínquo; mas isso [...] é, em todo o caso, a poesia da mesquinhez. Tout notaire, dizia G. Flaubert, a rêvé de sultanes. O ajudante de notário, porém, sonha apenas com uma sucessão de acontecimentos [ ?] em que entra a vizinha possível, o marido dela, ele galã, e assim por diante.
A literatura, como toda a arte, é uma confissão de que a vida não basta. Talhar a obra literária sobre as próprias formas do que não basta é ser impotente para substituir a vida.
“Erostratus”. in Páginas de Estética e de Teoria Literárias. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1966.
- 285.